Bolinha de mascar




- Do que você precisa em mim?
- Como assim? Não entendi.

- Esquece.

- Odeio quando você faz isso.

- Faço isso o quê?

- Esquece.
...

- Espera! Tudo bem, eu entendi.

- E por que disse antes que não?

- Ahh porra, sei lá!

- Pois é..esquece..
- E se eu te disser e você não me der o que eu quero?
- E daí? Você é retardado?
- Tá vendo, caralho, você é uma escrota!
- E daí? Você é mesmo um retardado.
- Vai à merda com sua arrogância!
- Pois é, foda-se..esquece..

Eu-Cidade



Nem foi abraçada e couberam todos os beijos sem boca ali.

E eram tantos beijos aqueles sobrados que suas pernas sedimentaram-se em casas. Oblíquas.

Imaginou Deus pela primeira vez, antes de desejá-lo, assim.

Posta, a cidade-observância andou levemente turista por ela e a abandonou, querendo a mendicância mas temerosa da paz embrulhada por jornais.

E amêndoas brotavam do jasmim.

Um dia..era uma vez. E nos bolsos da saia carregava o cavalo Zorba, um pião de quatro faces e uma semente de tamarindo.

Por cima da saia uma calça jeans surrada com cabelos grudados de sangue. No pé esquerdo, uma navalha. E partiu.

Cidade que era de telhados a céu quebrado por asas de cobre, fincou violentamente seis dias em uma hora.

Imaginou Deus pela segunda vez, o desejando. Bocas choveram granizo e também grená, o das feridas amenas que se acham fundas.
Tâmaras macias também jorravam.
Procurou a mandrágora, que lhe apetecia lembrar seu grito de enforcado na mão e afrontá-lo. Pisar a memória até a roda furar: seu furo era melhor, de fino útero. Buda, Jesus e os outros da arca só fizeram lamber um céu que tudo dá e nada seu comporta.

Colheu morangos na Etiópia e plantou girassóis no sertão baiano. No quintal do seu apartamento fez renascer um morto só para matá-lo mil vezes e brincar de amarelinha.

Nem foi beijada e cabiam todas as bocas ali.

Sua lua era uma mendiga particular...


O tempo passa e algo muda naquela casa azul.

As cadeiras ficam de pernas pro ar enquanto nasce a necessidade.O homem se favorece enfeitado e cantarola. Uma saliva, um pé de gigante, um cheiro roubado de alguma memória e todas as coisas repetem tristeza e passam a existir.

A tristeza boa vem negando a ruim, aquela de negar a boa. Uma boca que morda, uma que sopre. A que não cuspa pra cima, então.

Dói. Um dedo cortado não é como precisar. Chorar não é como molhar flores nem como ninar um morto. Mimar a morte é coisa de quem sabe sofrer. Não conheço ninguém que saiba realmente, quem o diz é embusteiro de si.

O sorriso acontece em seda rasgada, num baile de estamparia meio oriental, meio sinagoga. Vendido e comprado só a quem fabrica bordados desfazendo a linha. Um grito atrasado, eco e..onde está a boca que não cospe pra cima? Preciso de uma necessidade que supere a inexistência do espaço, tecerei olhos bons sobre os furados. Caberão mais furos então.

Aceite o presente roubado da sua vida pelo seu olho furado, desembrulhe o laço de carne e permaneça. Assombrando todas as necessidades.

O tempo passa e algo muda naquela casa cantarolando vermelho.

Todas as coisas são uma apenas, repetem segredos e passam a existir..