Assim Ó:

...só o bilheteiro do cinema decrépito viu quando a defunta foi perfurada com agulhas pelo cara da medicina legal. As perfurações foram só uma ferramenta teatral ocasionada pelo pacto que o segundo fizera com o motorista da ambulância para que este pagasse sua conta pendurada na barraca de praia.

O fato é que um coágulo explodira dentro do cérebro da moça e por isso não havia sangue espalhado por fora, só por dentro. Então o motorista da ambulância propusera ao médico que este dirigisse só naquela noite para que ele pudesse tirar uma foto com a defunta segurando seu pau e mostrar pros amigos no fim de semana. Mas então... tinha que aparecer sangue escorrendo, senão ninguém iria acreditar que ela estava morta realmente, pois ainda estava fresquinha de hoje e as faces ainda estavam ruborizadas de ar do campo. Onde já se viu defunto assim em foto?

Mas só o bilheteiro viu também a macheza do motorista esparramada em vômito colorido atrás da ambulância (arroz chinês, gorgonzola e vitamina de frutas). Ele queria o efeito de melança de sangue na moça mas não aguentou ver o close da ação vestida de branco. Aquilo lhe lembrou logo daquelas paredes alvas e cheirando a clorofórmio da maternidade em que nascera. Isso era demais, até pra ele, homem acostumado com gestantes parindo no meio da rua.

Mas voltemos ao cadáver mais protagonista. O homem de branco, enquanto lhe espetava agulhas, achou bizarro mesmo foi um saco de milho de pipoca que ela tinha no bolso esquerdo do vestido listrado em preto e branco. Riu muito daquilo, ficou perplexo, depois angustiado. Queria saber a razão daquilo de qualquer jeito. Como assim, milho de pipoca? Duvidou até da sua sanidade eugênica. Aquilo não era possível, mesmo assim pegou entre os dedos alguns grãos e viu que era isso mesmo.

Nisso o apito do trem do filme que passava no cinema decrépito escapa, soa na cena e há um anticlimax. Pipocas nunca mais? O médico chora comovido com a morte, finalmente.

Naquela noite o metrô nem partiu nem chegou porque o funcionário fizera uma rachadura na parede e rezara.

Cada coisa, hein? Isso tudo foi sexo.

15 comentários:

Anônimo disse...

Testando comentários no blog da Grazzinha!

Grazzi Yatña disse...

Porra, isso aqui daqui a pouco vai ter até teste do sofá!:P

Anônimo disse...

Testando sofá...

Anônimo disse...

Mesmo vez ou outra tendo a sensação que não consigo de verdade te alcançar, Grazzi, é sempre muito, muito gostoso te ler!

:)

Anônimo disse...

Grazzi, eu raramente consigo ler seus textos e entender totalmente, fico com a sensação de que adorei e que não sei pq. Nesse fiquei até nervosa.rs

Luis Surprises & Grazzi Yatña disse...

No final das contas, entre as pernas dos homens habitam ânsias...
Suas línguas se enroscam. E suas bocas procuram respostas.

Anônimo disse...

necrofilia é nojento. achei de pessimo gosto esse texto.

Paulo Castro disse...

Testando o gosto alheio:
Mesmo o "péssimo gosto" pode ser excelente sabor. Basta a ignorância ser testada em seus limites. Que burro de carga pode não consegir ver a doçura aqui? O espanto pelo milho de pipoca? A doçura do enfermeiro em "Fale Com Ela" de Almodóvar, que "usa o corpo" de uma moça em coma?
Não encontramos mais leitores, mas advogados, esses seres que julgam as superfícies, por não conseguirem mergulhar. Ou pelo contrário, advogados do "bonitinho" que gostam por algum motivo que nem mesmo eles entendem.
Claro que há a infâmia, mas há uma solidão. E uma poética da infâmia e da solidão.
Mas não vou explicar a mágica. O importante, Grazzi, é não esquecer que pérolas não são nunca aos porcos, mas aos poucos.
Beijos.
( penso em escrever a "primeira parte" dessa moça)
°

Zisco disse...

Só Tia Grazzi, isso mesmo , sexo seguro , e nada mais.

Anônimo disse...

nesse há uma sensualidade intensamente doce e mórbida

Anônimo disse...

Foda de ler isso logo hj pra mim.

Anônimo disse...

Meu telefone na sua caixa de mensagens. Quando precisar ser furada é só me ligar.
Quero ver até onde vc chora.

Grazzi Yatña disse...

Não tem coragem nem de botar a cara real aqui quanto mais...
Vai dar a bunda anônima na esquina.

Anônimo disse...

Vixe, vixe, vixe...
Impossível saber o que nos comove, nem sempre o que parece ser tão seguro, simples, frívolo realmente o é, difícil conhecer nossos limites, talvez por isso a gente os teste, os rompa, os investigue o tempo todo... ou então os deixe quietos pra não ter supresas decidindo ser um bilheteiro mecânico, um motorista assexuado ou um médico frio, um incapaz de observar, o outro sem sonhos eróticos com cadáveres, o último incorrompível. Eu ainda prefiro o assombro, a surpresa inesperada, a emoção que só um milho de pipoca pode causar. Ainda bem que teve sexo.

Izabel Xarru disse...

O texto? Soberbo.Fico emocionada, a razão dá licença.

ps- ah,adorei vc lembrar o cara que ele estava andando por aqui com uma bustica duma bunda anônima.coitado.